quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

PRECE

Cheguei
a transbordar de ti!
Corrias-me nas veias ...
e no pensamento.

Cheirei-te no orvalho
e afaguei-te no vento.
Estavas na urze,
no alecrim
e em toda a flor campestre!
Amadureceste nos figos
e na amora silvestre.
Andaste pelos penhascos
pela serra , pela areia
Senti-te bem presente
na lua cheia de Agosto.
Foste só minha
mas dei-te a toda a gente
Levei-te pela seara
apanhando caracóis
E foste vindima e mosto
E eras de linho e estopa
na noite dos meus lençóis!
Cheguei cheínho de ti
porque te tive a meu lado
Cantei-te como um poeta
Que sabe cantar o fado
E foste sino de aldeia
em alegria de festa
E triste, triste, tão triste
como em dobre de finados
( e se eu disser que te amo
dia-a-dia sempre mais?)
E arrastei-te pela água
e mergulhei-te no mar
e num veleiro de mágoa
te trouxe no meu olhar.
Em tudo o que foi palavra
em memória, pensamento
ou num gesto ou num sopro
numa raiz, numa árvore
num soluço, num lamento
te vi…
E até no sofrimento
me doeu a tua dor.
E digam lá
que não te tenho amor…
Tive ciúmes de ti
quando beijaste outra boca.
E andaste comigo ternamente
como louca.
Sinto-te agora mais perto
mais minha, mais completa
-É mais imenso o deserto
quando não se vê a meta…
Cheguei a transbordar de ti!
quero-te sempre a meu lado
Sê minha amante…
Ajuda-me a construir
o meu sonho descuidado.
Quero subir bem alto
contigo pela mão!
Exijo-o por condição!
Não me largues.
Não me deixes.
Sê comigo todo o dia.
És toda a minha razão…
Não me abandones
Poesia
( Humberto Sotto Mayor )